Saúde da População Negra - Cap 1

APRESENTAÇÃO


Saúde da População Negra  −  Brasil, Ano 2001 resulta de uma consultoria realizada por Fátima Oliveira para a OPAS−Brasil no rol das contribuições da OPAS à preparatória da III Conferência Mundial da ONU
contra o Racismo.

O trabalho desenvolvido pela consultora consistiu em uma sistematização do estado da arte do campo Saúde da População Negra no Brasil,
incluindo dados científicos, históricos e políticos, com o objetivo de obtenção de uma visão panorâmica do assunto. Saúde da População Negra – Brasil, Ano 2001 resulta, como afirma a autora, em uma “colcha de retalhos” tecida a muitas mãos, do ponto de vista da história e da elaboração teórica, pois a maioria das contribuições científicas aparecem aqui com voz própria. Isto é, houve definição à política de, na medida do possível, não reelaborar o pensamento original, ou analisar com “outras palavras”
os resultados de estudos já publicados, mas de transcrever na íntegra trechos e artigos considerados publicações relevantes, objetivando conferirlhes a visibilidade que merecem, afim de que cumpram o papel político que lhes é intrínseco: ampliar a compreensão da relevância das singularidades pertinentes à saúde da população negra e da necessidade de aportar às políticas de saúde e ao cotidiano da  assistência à saúde tais saberes.
Em  Saúde da População Negra – Brasil, Ano 2001 encontraremos embasamentos filosóficos, científicos, históricos, políticos e éticos que possibilitam uma compreensão ampla e multidisciplinar da temática, além
da proposta “Política  Nacional de  Saúde da População Negra: uma questão de eqüidade”, documento de subsídios para o debate da questão, também elaborado, sob os auspícios da OPAS−Brasil, por muitas pessoas ativistas e profissionais de saúde que há anos dedicam parte substancial de suas vidas à construção do campo Saúde da População Negra no Brasil.

Jacobo Finkelman

POPULAÇÃO AFRODESCENDENTE BRASILEIRA ... 17
1.1 Moradia, renda, escolaridade, vida e mortalidade ... 17
1.2 Índice de Desenvolvimento Humano do Brasil branco e do negro ... 20

SAÚDE DA POPULAÇÃO NEGRA
BRASIL, ANO 2001
INTRODUÇÃO
No presente estudo encontram-se dados sobre as condições sociais
e materiais de vida da população afrodescendente no Brasil, incluído o
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) desagregado por gênero e
quesito cor, o que possibilita comparar o IDH de brancos e negros. Há
uma abordagem sobre os novos saberes decorrentes das pesquisas sobre o
genoma humano (conjunto de genes dos seres humanos) à luz da discussão sobre a opressão racial/étnica e o direito à diferença e à igualdade.
Na parte I, as considerações sobre assimetrias econômicas, exclusões e
vulnerabilidades são ilustradas com uma coletânea de histórias exemplares de como o racismo historicamente tem operado na assistência e na
pesquisa em saúde e constituem subsídios indispensáveis à reflexão sobre
raça, etnia, racismo e biociências, assim como das  ideologias racistas, tais
como darwinismo social e eugenia (parte II) – embasamentos teóricos
necessários à percepção crítica para melhor compreensão da conceituação
do campo denominado Saúde da População Negra, aqui entendido como
um conjunto de estudos, pesquisas e propostas de atenção à saúde.
Na parte III, discorre-se sobre as evidências do recorte racial/étnico
na assistência e na pesquisa em saúde, com um resgate das discussões e
ações sobre o quesito cor no Brasil relativas às doenças/condições que
incidem de forma diferenciada na população negra, com os temas: mortalidade precoce de afrodescendentes; diabetes tipo II; hipertensão arterial; miomas uterinos; anemia falciforme e Programa Estadual de Triagem Neonatal de Minas Gerais (PETN-MG); deficiência de glicose-6-fosfato
desidrogenase (G-6-PD); mortalidade infantil; mortalidade materna;
síndromes hipertensivas na gravidez e mortalidade materna, além de
outras doenças sobre as quais há indícios de incidência expressiva em
mulheres negras, tais como câncer cérvico-uterino, e no conjunto da
população negra, como a infecção por HIV/AIDS; raça e acesso às ações
prioritárias na agenda de saúde reprodutiva; dados de estudos sobre a
Lei de Planejamento Familiar, esterilização, cesárea e quesito cor; violência, violência de gênero, recorte racial/étnico e saúde.
Na parte IV, aborda-se breve história da construção do campo da
saúde da população negra no Brasil, por meio dos debates e das lutas14
INTRODUÇÃO
relativas ao quesito cor; das reivindicações do Movimento Negro na
área da saúde; das respostas acadêmicas e do movimento social negro e
outros aliados, que demonstram o estado da arte dos estudos sobre a
saúde da população negra no Brasil. Apresentam-se as respostas governamentais, isto é, as ações do governo brasileiro nos anos 1990-2001.
No rol das constatações, há uma análise, inicial e incompleta, sobre a
implantação do quesito cor  e das ações em relação ao recorte racial/
étnico no âmbito do Ministério da Saúde.
Após as justificativas  pertinentes à necessidade de inclusão do recorte racial/étnico nas diretrizes e ações do Ministério da Saúde, encontram-se (parte V) as recomendações ao governo brasileiro e à OMS/OPAS –
um conjunto de propostas, resultantes do processo de consultoria, que,
considerando a realidade, visam focalizar a atenção em políticas de saú-
de para a população negra. Tais recomendações, além de outros documentos, foram utilizadas nos debates que resultaram na proposta de
Política Nacional de Saúde da População Negra, elaborada pela OPAS/
Brasil, em diálogo permanente com ativistas e pesquisadores negros da
área da saúde.
Nos anexos deste livro, encontram-se entrevistas com duas personalidades, a professora Elza Berquó e o professor José Nélio Januário, que
têm dado relevantes contribuições  à luta da população negra pelo direito à saúde em nosso país; dois documentos do Ministério da Saúde
sobre anemia falciforme: o Programa de Anemia Falciforme (PAF/MS) e a
portaria que criou o Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN); e
a tabela da distribuição percentual da população brasileira, por cor e
unidade da Federação.PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES,
VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E
PESQUISAS EM SERES HUMANOS17
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
A expectativa de vida (tempo provável de vida) retrata as
condições materiais e sociais (meio ambiente físico, social,
político e cultural em interação com as condições biológicas
de cada ser humano). A expectativa de vida, pode-se dizer,
resulta do processo sanidade/enfermidade, que é multifatorial
e complexo e tem a ver com as formas de interação das condi-
ções sociais e materiais de vida com as condições biológicas de
cada ser humano.
Podem-se medir as condições sociais e materiais de vida de uma
população considerando, entre outros, fatores como local e condições da moradia (perfil dos domicílios), condições de trabalho (ocupação e renda familiar), acesso a escolas, e qualidade da
atenção por parte dos serviços e profissionais de saúde.
1.1 MORADIA, RENDA, ESCOLARIDADE,
VIDA E MORTALIDADE
O documento Nós, Mulheres Negras (2001) afirma que, no Brasil,
“afrodescendentes residem nas áreas mais inóspitas das regiões urbanas
Capítulo 1
CONDIÇÕES MATERIAIS E SOCIAIS DE VIDA DA
POPULAÇÃO  AFRODESCENDENTE  BRASILEIRA18
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
e em espaços rurais também carentes de políticas públicas essenciais para o
exercício da cidadania, tais como saneamento básico, escolas e instituições
de saúde, que quando existem são de baixa qualidade. Assim como estão
alocados nos trabalhos que exigem pouca qualificação profissional, cuja
renda mensal é irrisória, logo insuficiente para cobrir necessidades vitais
como, por exemplo, alimentação adequada. Agregam-se às precárias condições materiais de vida práticas racistas, firmemente arraigadas na sociedade brasileira, que contribuem decisivamente para a manutenção e até
piora da baixa estima e risco de adoecimento físico e mental”.
¾ Local e tipo de moradia – Os dados disponíveis no Brasil sobre
o perfil dos domicílios foram levantados pela Pesquisa sobre Padrões de
Vida (PPV), que entre março de 1996 e março de 1997 pesquisou 5 mil
domicílios em seis regiões metropolitanas (Fortaleza, Recife, Salvador,
Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro) e outras áreas urbanas e
rurais do Nordeste e Sudeste, cobrindo um total de 70% da população
brasileira. O documento Dados e Informações. Mulheres Negras: um retrato da discriminação racial no Brasil/2001, da Articulação de Mulheres
Brasileiras, afirma que:
“De acordo com a Pesquisa sobre Padrões de Vida (PPV/IBGE-1996),
32% dos domicílios com chefes afrodescendentes foram classificados
como inadequados, contra 12% dos domicílios com chefia branca. Apenas 26% dos domicílios considerados adequados tinham chefia
afrodescendente, contra 54% dos chefiados por brancos;
os domicílios sem acesso à água tratada foram 35% entre os de chefia
afrodescendente, contra 19% para os de chefia branca; e
os domicílios sem esgoto sanitário foram 50% entre os chefiados por
afrodescendentes, contra 26,4% entre os chefiados por brancos”.
¾ Tipo de ocupação e nível de renda – A demógrafa Elza Berquó,
na pesquisa Perfil Demográfico das Chefias Femininas no Brasil (dados
do Censo de 1991 e da PNAD de 1998), concluiu que:
“nas famílias chefiadas por mulheres que não têm rendimento ou recebem menos do que um salário-mínimo, as chefiadas por negras são 60%;
já entre as que recebem três ou mais salários-mínimos, a participação
das chefiadas por mulheres negras cai para 29%;
as mulheres negras chefes de família possuem escolaridade mais baixa
do que as brancas, destacando-se a alta proporção de analfabetas, com
27,6% em 1998, contra 15% das brancas; e19
CAPÍTULO 1
CONDIÇÕES MATERIAIS E SOCIAIS DE VIDA DA POPULAÇÃO AFRODESCENDENTE BRASILEIRA
no cruzamento de dados como escolaridade, estado conjugal, número de filhos, etc., as mulheres negras estão sempre em piores condições, o
que possibilitou à pesquisadora concluir que: “A escolaridade é, para estas chefias, um primeiro marcador de pobreza, seguida pelo estado conjugal, com um diferencial racial”.
¾ Escolaridade – A Pesquisa sobre Padrões de Vida (1996-1997)
mostra que a população branca tem maior escolaridade do que a
afrodescendente em todas as faixas de idade, com desigualdades educacionais mais acentuadas entre as crianças de 0 a 6 anos, com uma diferença de 8,4 pontos percentuais: 31,9% para os brancos e 23,5% para
pretos e pardos; e entre os adolescentes de 15 a 17 anos, com 10,7
pontos percentuais (brancos, 80,1% e pretos/pardos, 69,4%).
¾ Expectativa de vida -  A população afrodescendente brasileira
tem uma expectativa de vida 6 anos inferior à da população branca (respectivamente 64 e 70 anos);
mulheres afrodescendentes têm uma expectativa de vida de 66 anos,
que é alguns meses abaixo da média nacional (66,8 anos), 5 anos abaixo
da das mulheres brancas e 3 anos abaixo da dos homens brancos. Esse
dado contraria a tendência (que é mundial) de que as mulheres vivem
mais do que os homens; e
as mulheres negras têm 25% a menos de chance de chegar aos 75
anos do que as mulheres brancas.
Analisando dados da Fundação Seade sobre os óbitos no Município
de São Paulo em 1995, a pesquisadora Maria Inês da Silva Barbosa
constatou que, das mortes ocorridas antes dos 50 anos, a proporção de
mulheres negras (40,7%) era quase igual à de homens brancos (39%).
Nos óbitos na faixa acima de 55 anos, os homens brancos atingem 54,6%
dos casos, para 52,4% das mortes de mulheres negras. Esses dados confirmam que, no que diz respeito às brasileiras negras, está sendo quebrada a “regra” de que as mulheres vivem mais que os homens. A esperada
diferença por sexo só se confirma quando se comparam os dados dos
homens negros, que perdem mais anos de vida do que todos os outros
segmentos, e não apenas o das mulheres negras.
¾ Mortalidade infantil e materna –  A mortalidade infantil e a
materna são dois indicadores que retratam com fidelidade as condições20
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
e a qualidade de vida , além de evidenciar a crueldade que é morrer
precocemente.
Na análise da mortalidade infantil e materna , considerando-se o recorte racial/étnico em afrodescendentes, os dados evidenciam a omissão
dos governos e revelam discriminação de classe e indiferença racial/étnica.
A diferença entre a mortalidade infantil entre as crianças negras e as
brancas no Brasil tem aumentado muito a despeito de a mortalidade
infantil no país vir caindo consideravelmente. Dados de Estela Maira
afirmam: houve piora acentuada na taxa de mortalidade infantil de 1980
para 1991. Em 1980, para cada 1 000 nascidos vivos, morriam 76 brancos e 96 negros. Em 1991, para cada 1 000 nascidos vivos, morriam 43
brancos e 72 negros. A diferença aumentou, pois em 1980 as crianças
negras apresentavam índice de mortalidade 21% maior do que o das
brancas e, em 1991, esse índice aumentou para 40%.
A taxa de mortalidade infantil das crianças afrodescendentes foi de 62,3
por 1 000 de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
de 1996. No caso das crianças brancas, essa taxa foi de 37,3 por 1 000.
Nas taxas de mortalidade de crianças menores de 5 anos as diferen-
ças são mais expressivas: 76,1 por 1 000 para afrodescendentes e 45,7
por 1 000 para as brancas.
Quanto à mortalidade materna no Brasil, Alaerte Leandro Martins
pesquisou 956 óbitos maternos no Estado do Paraná, na faixa etária de
10 a 49 anos, ocorridos de 1993 a 1998, e concluiu que, comparada à
de brancas, a mortalidade materna das amarelas é 7,5 vezes maior e a das
pretas, 6,6 vezes maior. Eis um sinal de alerta para quem idealiza e
gerencia saúde pública no Brasil: não há mais como esconder a cara e a
cor de quem “morre de parto” no Brasil!
1.2 ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO (IDH)
DO BRASIL BRANCO E DO NEGRO
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), criado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), é uma
metodologia que considera como indicadores a educação, a expectativa21
CAPÍTULO 1
CONDIÇÕES MATERIAIS E SOCIAIS DE VIDA DA POPULAÇÃO AFRODESCENDENTE BRASILEIRA
de vida e o rendimento per capita. Considerado o IDH em 1999, o Brasil
foi alocado no ranking mundial na 79
a
 posição, isto é, um país de desenvolvimento humano mediano.
Em 1999, a pesquisadora negra Wânia de Jesus Santa’Anna e o pesquisador negro Marcelo Paixão, em trabalho desenvolvido para a Federação de Associações de Órgãos de Assistência Social e Educação (FASE),
calcularam os indicadores que o PNUD usa para o IDH para negros, brancos e mulheres no Brasil. Ou seja, desagregaram o Índice de Desenvolvimento Humano por sexo e raça da população afrodescendente (pretos
e pardos), o que possibilitou desvendar a dimensão do sexismo e do
racismo nas áreas da educação, da expectativa de vida e na renda per
capita. Resulta que o IDH da população negra coloca o Brasil, em 1999,
na 108
a
 posição, em contraponto ao da população branca, que ocupa a
49
a
 posição. O IDH para negros e brancos no Brasil foi também aplicado
para os anos de 1997 e 1998.
Ë A população brasileira é constituída de 54% de brancos;
afrodescendentes: 5,4% de pretos e 39,9% de pardos;
Ë 91,7% dos brancos com mais de 15 anos eram alfabetizados, contra 80,2% de afrodescentes;
Ë a média da expectativa de vida do Brasil é de 68 anos, mas para
brancos fica em torno de 71,23 anos e para afrodescendentes é de 65,12
anos; e
Ë a renda per capita (média da renda familiar) entre brancos é de
2,99 salários-mínimos e entre negros é de 1,28 salários-mínimos.
A historiadora Wania Sant’Anna (2001) afirma:
“Frente à demanda da UNIFEM em elaborar um  paper sobre ‘raça e
pobreza’ optei por utilizar o Índice de Desenvolvimento Humano das
populações afrodescendente e branca como fio condutor dessa análise.
Esta opção foi feita por duas razões fundamentais: a aceitação do Índice
de Desenvolvimento Humano como um parâmetro de avaliação das condições de vida da população de um expressivo número de países; e a
credibilidade adquirida pela formulação do IDH ajustado à realidade étnico/
racial na população brasileira. No que diz respeito a desigualdades existentes entre homens e mulheres brancos, homens e mulheres afrodescendentes
a elaboração do Índice de Desenvolvimento ajustado ao Gênero (IDG) constitui uma novidade e uma tentativa de conhecer melhor essa realidade a22
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
partir e relacioná-la ao IDH. Além disso, também como inovação, apresentamos o IDH desagregado para homens brancos e mulheres brancas.”
Sob a denominação de “O sonho da igualdade versus a realidade das
diferenças”, Wânia Sant’Anna analisa que
“As desigualdades sociais e econômicas existentes entre brancos e negros no Brasil, que se traduzem em um surpreendente quadro de desigualdade racial, seriam suficientes para intuir que as mulheres negras
constituem o grupo mais frágil desta relação. No entanto, para além desta ‘inevitável’, porque decorrente, situação de fragilidade, o quadro é extremamente agravado pela magnitude das diferenças existentes entre as
mulheres negras, homens brancos, mulheres brancas e, também homens
negros. A magnitude das diferenças existentes entre mulheres negras e
mulheres brancas é que nos exige cautela em ressaltar, por exemplo, apenas as desigualdades de gênero para caracterizar a situação social, política e econômica das mulheres brasileiras. Afinal, para as mulheres negras
a dimensão racial constitui variável fundamental para a posição social,
econômica e política que ocupam.”
A expectativa de vida, segundo o IDH (Índice de Desenvolvimento
Humano) desagregado por gênero e raça, é, respectivamente: homens
brancos, 69 anos; mulheres brancas, 71 anos; homens negros, 62 anos;
e mulheres negras, 66 anos. A média de expectativa de vida para o total
de brancos é de 70 anos e para o total de negros é de 66,8 anos.
Os dados relativos à renda informam que o PIB per capita das mulheres negras é de 0,76 SM; homens negros: 1,36 SM; mulheres brancas:
1,88 SM; e homens brancos, 4,74 SM. No tocante ao índice de escolaridade são, respectivamente: 82% para homens brancos, 83% mulheres
brancas, 76% para mulheres negras; 70% para homens negros.
Diante dos dados mencionados, entende-se porque Wania Sant’Anna
(2001), de modo contundente, diz que:
“Sinteticamente, queremos afirmar que as ações de combate às desigualdades raciais ajudam, mas não são suficientes aos interesses e necessidades das mulheres negras. Da mesma forma, as ações de combate às
desigualdades de gênero ajudam, mas , igualmente, não são suficientes
aos interesses e necessidades das mulheres negras. A superação das desigualdades de gênero e raça vividas pelas mulheres negras requer ações
especialmente destinadas a elas porque possuem características próprias23
CAPÍTULO 1
CONDIÇÕES MATERIAIS E SOCIAIS DE VIDA DA POPULAÇÃO AFRODESCENDENTE BRASILEIRA
ao fato de serem mulheres negras. Sua história e imagem construída, por
exemplo. Algo que toca fundo nas comunidades nas quais são maioria e
também nas quais são minorias”.
As condições sociais e materiais de vida (meio ambiente físico, social,
político e cultural) influenciam de modo contundente, ainda que de
maneira indireta, o processo saúde/doença e, conseqüentemente, a expectativa de vida. Há fatores que influenciam diretamente na atenção à
doença; dentre outros, destacam-se: restrições e/ou oportunidade de
acesso, a qualidade da atenção e a discriminação – tendo por base a
classe social, o gênero, a raça/etnia, a faixa etária e a orientação sexual –
por parte de instituições e profissionais de saúde. Exercem também influências indiretas: o lugar e o tipo de moradia; o tipo de ocupação e o
nível de renda; a qualidade e o acesso à educação; o direito ou não ao
alimento; e o estilo de vida (hábitos alimentares e comportamentos saudáveis ou nocivos à saúde).
Diante do exposto, cabe ressaltar no esforço da OPAS/OMS de abordagem da eqüidade em saúde via perspectiva étnica as seguintes conclusões:
“O que o enfoque de etnia tem de novo é o fato de permitir que seja
melhor definido não só o problema, mas também a solução, que estará
em desenvolver os laços de solidariedade e reciprocidade familiar e comunitária que permitirão reconstruir as identidades fraturadas e as
potencialidades de fortalecimento da etnicidade dos grupos preteridos.
Trata-se de todo um novo desafio trabalhar no âmbito da saúde com
esses novos conceitos. As políticas atuais nem sempre são sensíveis às
variáveis etnia/raça e isso exige focalização, a fim de evitar uma distribui-
ção retrógrada dos recursos de saúde.
Finalmente, vem à baila a pergunta: como avançar nesse processo?
Relacionam-se adiante algumas tarefas imediatas:
Melhorar a informação disponível por meio de novos estudos de casos;
Colaborar com as instituições nacionais no aprimoramento dos instrumentos de coleta de informações, para torná-los mais sensíveis às variáveis de etnia e raça;
Aprofundar o conhecimento da evolução da interculturalidade no
que se relaciona com a saúde no Caribe e no Canadá;
Elaborar e selecionar instrumentos para uma focalização positiva das
políticas de saúde, em benefício das populações descendentes de povos
indígenas e africanos;24
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
Desenvolver capacidades no âmbito das comunidades afro-americanas de países selecionados para participar na elaboração e avaliação de
programas e políticas de saúde; e
Identificar as melhores práticas nos locais onde tenham sido promovidos programas de saúde em grupos étnicos com apoio intersetorial e
com o concurso da comunidade, para que sirvam de exemplos positivos
a emular.” (TORRES, 2001).25
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
A inexistência de raças humanas é uma verdade científica, mas o
racismo é uma realidade cruel, segregacionista, excludente e que
freqüentemente assume a face de genocídio, às vezes sutil, localizado,
mas marcadamente genocídio que, conceitualmente, consiste em atingir a integridade corporal ou mental para eliminar – no todo ou em
parte – um grupo religioso, nacional, racial ou étnico. Ou ainda realizar
deportações ou medidas contraceptivas, sem o consentimento livre e
esclarecido, contra esses segmentos de uma sociedade. Trata-se pois de
um crime contra a humanidade.
Na década de 1980, o movimento feminista teve como grandes bandeiras o direito à diferença e o direito à igualdade, objetivando demarcar a
diferença biológica com os homens e afirmar que diferença não era sinô-
nimo de desigualdade social e política. Esse lema aglutinou mulheres em
luta em todo o mundo. Em meados dessa década, assistiu-se a uma
mobilização importante das mulheres negras em vários países. Na Amé-
rica Latina, em especial no Brasil, esta foi uma movimentação de vulto.
Em meio a tudo isso, as mulheres negras se aferraram a este slogan para
dizer que a “irmandade” das mulheres (confraria que o feminismo tentaCapítulo 2
A OPRESSÃO RACIAL/ÉTNICA, O DIREITO À
DIFERENÇA E À IGUALDADE E SEUS REFLEXOS NA
ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE26
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
va fazer existir) não se concretizava, dentre outras coisas, porque entre as
feministas existiam clivagens de raça e de classe, situações em que a
sororidade entre as mulheres jamais medraria. Desnudar e desmistificar
essa situação era essencial, porque o feminismo encarava “as mulheres”
como se não houvesse nenhuma diferença entre elas. Mas cada mulher
pertence a uma dada classe social, estudou ou não, e é preta, amarela ou
branca. Tudo isso faz uma enorme diferença na vivência da opressão.
Os fundamentos que embasam o discurso feminista do direito à diferença e à igualdade são os mesmos para a chamada “questão racial”.
Todavia tal discurso foi usurpado pela direita mundial, sobretudo pela
velha direita européia que dele usa e abusa para a defesa agressiva de
seus territórios e para discriminar os imigrantes “não-brancos”. Nada
mais nada menos que a associação, funesta, de xenofobia e racismo.
Enveredar pelas teorizações do campo da saúde da população negra é
ter a certeza de que há necessidade de responder a muitas perguntas pertinentes e impertinentes sobre, por exemplo, raça e etnia, ideologia e prática racistas e ciências biológicas, opressão racial/étnica, direito à diferença
e à igualdade, assimetrias econômicas, exclusões e vulnerabilidades. Todas
são questões que impõem reflexões sobre as origens do darwinismo social
e da eugenia – ambas deturpações racistas de saberes oriundos das
biociências – e sobre a instalação e o desenvolvimento de tais doutrinas e
práticas no mundo, cujos tentáculos aparentemente são eternos, posto
que possuem uma extraordinária capacidade de reciclagem e reaparecem
sob nova roupagem, sempre!
Já está fartamente comprovado que o biologicismo rasteiro,
determinista e vulgar, tão antigo que é anterior à estruturação da biologia, possui matriz racista. Portanto não é exatamente uma novidade o
atual “esforço” que pretende provar que os genes que possibilitam um
dado fenótipo racial são os mesmos que prioritariamente causam doen-
ças. Tais teses são uma reedição de antigas idéias eugeno-racistas, atualmente em busca de uma capa de DNA (ácido desoxirribonucleico). Oliveira (1995 e 1999) assim se expressou a respeito:
“O darwinismo social é uma doutrina que tenta explicar a vida social
nos moldes da evolução biológica, transpondo os fenômenos evolutivos
na natureza para a vida humana em sociedade. Diferentemente do que
muita gente acredita, não foi com a Teoria da Evolução (1859) que sur-27
CAPÍTULO 2
A OPRESSÃO RACIAL/ÉTNICA, O DIREITO À DIFERENÇA E À
IGUALDADE E SEUS REFLEXOS NA ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE
giu um pensamento social pretensamente baseado nos conhecimentos
biológicos. Estas eram idéias que já possuíam um corpo próprio de
teorização na Europa e EUA no século XIX, antes mesmo de Darwin e
Wallace tornarem públicas suas idéias. O darwinismo social não é portanto uma novidade, nem uma idéia original, apenas um produto genu-
íno de uma época, em consonância com as mais íntimas aspirações de
seu poder político, tendo como fio condutor a idéia de que há seres humanos que nascem ‘inferiores’. Eis uma das muitas faces da opressão!
O darwinismo social atual atende pelo nome de sociobiologia, que
criou uma ‘nova teoria humana’, em que o comportamento social é ditado
e regulado, prioritária ou exclusivamente, pelos genes. Para esta “ciência”,
o biologicismo é decisivo de tal forma que a meta de ‘melhoramento’ humano só será atingida através de modificação genética. A sociobiologia
1
 se
diz uma corrente darwinista cuja base teórica é o fatalismo genético
2
 e não
considera a cultura como um fator decisivo de diferenciação entre o comportamento humano e dos demais animais”.
Cabe lembrar que a sociobiologia no aspecto ideológico, tal como a
sua face rudimentar, o darwinismo social, não é também uma novidade
nem uma idéia original.
1
 O biólogo estadunidense Edward O. Wilson, professor da Universidade de
Harvard, autor de Sociobiologia: a nova síntese (1975), organizou o campo da
sociobiologia como a intersecção da biologia com a sociologia e a antropologia, e conceituou-o como “uma disciplina científica que objetiva explicar
em bases biológicas os comportamentos dos seres vivos.” As maiores expressões da sociobiologia são, dentre outros, os ingleses Desmond Morris,
autor de várias obras de popularização da ciência na área, e Richard Dawkins,
autor de O gene egoísta.
2
 Fatalismo genético ou “determinismo genético é a idéia que genes estáveis
determinam os caracteres dos organismos de maneira simples, exceto no
caso de mutações esporádicas e causais; que os genes são imunes às influências ambientais e passam intactos de uma geração para outra [...] Estabilidade da herança e reprodução estável de um organismo, não residem na estabilidade de seus genes, é bem mais distribuída em todo o sistema de desenvolvimento inerente ao meio ambiente ecológico. Em outras palavras, a vida
é inerentemente e irredutivelmente holística” (HO, 1995). Ver também Oliveira (1994 e 1995).28
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
É tendo em consideração tal realidade que, à guisa de introdução, as
partes I e II desta obra versarão sobre tais assuntos, objetivando sedimentar
uma percepção crítica capaz de alicerçar idéias, práticas políticas e cientí-
ficas na elaboração e construção do campo denominado saúde da popula-
ção negra, que na Conferência das Américas (PrepCom do Chile, 5 a 7 de
dezembro de 2000) foi alçada para a “ordem-do-dia”, com a aprovação
de dois pontos sobre saúde apresentados pelo Brasil
3
 – reivindicações que
refletem os duros embates que vêm sendo travados em território brasileiro, em especial pelo Movimento Negro e cientistas aliados, para estabelecer e consolidar o campo de estudos, pesquisa e assistência denominado
de saúde da população negra. Oliveira (2001) afirma que:
“Para compreender a importância política e histórica do que foi conquistado no Chile é preciso saber que não havia sequer menção às palavras saúde e genética no documento que serviu de base para a elaboração
da Declaração e do Plano de Ação da PrepCom do Chile. O silêncio da
conferência relativo à temática saúde revelou, entre outras coisas, a
incompreensão de que as políticas de saúde, tanto na assistência quanto
na pesquisa, podem ser ferramentas importantíssimas e especiais de combate ao racismo.
O legado da Conferência do Chile responsabiliza o movimento social e o governo brasileiro pelas gestões junto aos outros países-membros
da ONU para que na Conferência da África do Sul, em setembro de 2001,
o tema saúde receba o destaque que merece. O ponto de partida, o maior
problema de saúde, revelador do racismo que a população negra enfrenta, é a mortalidade precoce – pelo menos no Brasil, os negros morrem
antes do tempo em todas as faixas etárias da vida. Há que levar em conta
também a importância que as questões relativas à genética têm para a
população negra e a indígena”.
Um indicador importante das preocupações do Sistema Nações
Unidas relativas à saúde da população negra é o documento Eqüidade
3
 O primeiro se refere à necessidade de ações, por parte da Organização PanAmericana da Saúde (OPAS), para o reconhecimento do recorte racial/étnico
e de gênero no campo da saúde, acrescido de recomendação aos governos
para a execução de políticas de atenção à saúde da população negra. O segundo é a inclusão da “condição genética humana” no rol das possibilidades
de discriminação (discriminação e/ou violência genética).29
CAPÍTULO 2
A OPRESSÃO RACIAL/ÉTNICA, O DIREITO À DIFERENÇA E À
IGUALDADE E SEUS REFLEXOS NA ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE
em saúde: uma visão pelo prisma da etnicidade (TORRES, 2001)
4
 no qual
constam as seguintes opiniões:
“uma idéia central que ocupa hoje a agenda política do desenvolvimento é a de que só com o aumento da eqüidade é possível alcançar a
redução da pobreza;
no que tange ao setor da saúde, o desafio atual consiste em contribuir para a diminuição da pobreza mediante o aumento da eqüidade
em saúde; e
por sua parte, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS)
perfilha a preocupação comum aos governos da Região das Américas
pela mitigação da pobreza, para tanto orientando parte dos seus esforços
para o trabalho em prol da redução das iniqüidades em saúde. Por essa
razão, a Divisão de Saúde e Desenvolvimento Humano concentrou a
sua cooperação técnica em eqüidade e saúde. Nesse contexto, o presente
trabalho tem por objetivo contribuir para o estudo das iniqüidades em
saúde explorando a relação entre saúde e etnicidade”.
O trabalho mencionado é meritório ao buscar deslindar as relações
entre diferenciais de saúde e origem étnica tendo como centro a relação
situação de saúde e etnicidade na América Latina, considerando os diferentes contextos socioeconômicos e históricos da região e com a preocupação de:
“captar como as lideranças políticas e os organismos de cooperação
percebem o assunto;
se há variações nas condições de saúde entre os diferentes grupos éticos
e a razão pela qual ditas variações podem estar presentes em toda a região,
não obstante as marcadas diferenças socioeconômicas e históricas;
por que existem tais variações? Ou, noutras palavras, um enfoque na
etnia tem maior alcance explicativo que o da classe social ou da pobreza
para a análise de diferenças sociais e de saúde?;
indagar qual a forma pela qual são mensuradas as ineqüidades em
saúde devidas a discriminações raciais ou étnicas; e
apresentar conclusões que pretendem abrir o debate e contribuir para
a formulação de políticas públicas com vistas à identificação e à redução
de ineqüidades de saúde de origem étnica”.
4
A autora, Cristina Torres, é assessora regional de políticas do Programa de
Políticas Públicas e Saúde, da Divisão de Desenvolvimento Humano, da
OPAS/OMS.30
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
No intertítulo “Algumas considerações conceituais” (TORRES, op.
cit.) encontra-se o seguinte:
“A pergunta que nos ocupa aqui é: por que podem existir diferenças
de situação de saúde vinculadas às origens étnicas dos indivíduos? A primeira resposta poderia estar no fato de que eles são geneticamente diferentes. Deve-se iniciar por um esclarecimento conceptual da distinção
entre raça e grupo étnico”.
Após as considerações sobre raça e grupo étnico, encontra-se o seguinte:
“Desta maneira, pode-se deixar de fora o fator genético, devendo-se
assim buscar as razões das diferenças em saúde em fatores sociais e culturais
capazes de explicar por que os indivíduos se expõem a trabalhos mais insalubres, a residir em bairros com menos serviços, a não fazer uso de informa-
ções para prevenir doenças, a evitar restrições ao acesso aos serviços por
motivos de distância, horário ou outros fatores e a buscar serviços menos
dotados e menos capazes de resolver seus problemas. E, finalmente, quais
são os fatores que levam alguns indivíduos a adiar a decisão de procurar
uma consulta médica? Seria apenas a existência de uma brecha entre os que
possuem meios econômicos e os que não possuem? Haveria outras diferen-
ças que poderiam ajudar a encontrar uma resposta?”
Há opiniões mais amplas sobre o tema. Por exemplo, Krieger e Basset
(1986) dizem que
“A elucidação e a prevenção precisas dos componentes materiais e
ideológicos dos processos da enfermidade fazem necessária a adoção explícita de um ponto de vista anti-racista e com consciência de classe [...]
está bastante evidente que precisamos de novos enfoques para compreender a interpenetração do racismo, das relações de classe e saúde. Para
desemaranhar e eliminar as diferenças entre brancos e negros na enfermidade devemos começar a denunciar politicamente, e não tão-somente
descrever as raízes sociais do sofrimento e da enfermidade [...] Devemos
também desmascarar o fundo classista dos modelos das enfermidades
[...] devemos nos empenhar em desenvolver um modelo anti-racista das
causas das doenças. E, em última instância, apelar para uma ciência antiracista é exigir uma ciência com consciência de classe. Não podemos nos
conformar com menos”.
Oliveira (1993) afirma que:
“As diferenças e diferenciais raciais/étnicos são realidades inegáveis do31
CAPÍTULO 2
A OPRESSÃO RACIAL/ÉTNICA, O DIREITO À DIFERENÇA E À
IGUALDADE E SEUS REFLEXOS NA ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE
nosso tempo. Não sabemos exatamente, na maioria das vezes, onde começam e até onde vão os alcances e limites da predisposição biológica.
Não são compreensíveis ainda todos os passos e os limites entre a saúde
e a doença. Mas, reconhecemos que há condições de sanidade/enfermidade relativas ao sexo e às raças/etnias, embora não saibamos com exatidão quais todas as causas desta realidade”.
As evidências do recorte racial/étnico no processo saúde/doença, cuja
abordagem ampla encontra-se na parte III, em geral são invisibilizadas
por argumentos de inspiração anti-racistas oriundos de duas matrizes
humanitárias, que em geral se entrecruzam, a tal ponto que é extremamente difícil separar uma da outra.
A primeira matriz, de cunho ideológico, de inspiração inegavelmente anti-racista, se expressa, na prática, como uma contraposição ao
darwinismo social e à eugenia. Sem dúvida, há razões mais que suficientes no debate e nas teorizações sobre o processo saúde/doença para que
se combatam as posturas racistas e as de discriminações de classe.
A principal delas é a idéia equivocada e anticientífica de que há seres
humanos superiores e inferiores.
A história da humanidade está repleta de fatos exemplares dos danos
causados pelas discriminações classistas, sexistas e racistas na área da
saúde, grande parte deles alicerçados em visões biologizantes de
hierarquização dos grupos populacionais raciais ou étnicos. Não há dú-
vida também que tais visões em geral constituem grosseiras deturpações
dos saberes biológicos.
Porém, na atualidade é também uma deturpação inaceitável não considerar a condição biológica do ser humano que, a exemplo de qualquer
ser vivo, é também regido por leis biológicas. É inaceitável, porque
anticientífico, que não seja percebida a interpenetração das variáveis sexo/
gênero, raça/etnia e classe social como informadora do processo saúde/
doença. Não há como desconsiderar a condição biológica humana em
interpenetração com as condições sociais, culturais e materiais nas quais
vive, posto que está comprovado que é impossível dizer qual é mais
importante, se o meio ou a condição biológica dos seres vivos, pois
ambos são interdependentes!
A segunda destaca as dificuldades e as diferentes formas de “nomea-
ção”, seja por raça ou por etnia, o que cria dificuldade de definição de32
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
um parâmetro para comparabilidade.
5
 Alega também que a escassez de
pesquisas com recorte racial/étnico nas populações vítimas do racismo,
em particular as “não-brancas”, não permite conclusões passíveis de generalização. Na verdade, tais argumentos criam um círculo vicioso. Não
há dados, logo não é possível generalizar. Generalizar não é possível,
posto que não há dados. Mas sair do círculo vicioso exige responder,
sinceramente, à pergunta: mas por que os dados não são produzidos?
Mas por que é possível generalizar que a saúde das populações vitimadas pela discriminação racial não recebe a atenção necessária na assistência e na pesquisa?
Tais matrizes informam as propostas de solução para os “problemas
de saúde” que incidem nas populações “não-brancas” por meio de tentativas de correção das assimetrias em geral via políticas de combate à
pobreza com instrumentos que tenham foco nas populações vulnerá-
veis. Cabe lembrar que vulnerabilidade é um conceito aplicável aos casos nos quais a autonomia poderá estar diminuída: por idade, doença,
sexo/gênero – no caso das mulheres em idade fértil, de privação de liberdade, etc. O critério/idéia de vulnerabilidade incorpora a vulnerabilidade
social, biológica, de sexo/gênero e hierárquica, todas situações nas quais
o poder e a autonomia encontram-se diminuídos.
6
5
 Há diferentes maneiras de coletar e analisar informações estatísticas. Torres
(2001) informa que há nos EUA expressivo acúmulo de informações estatísticas, pesquisas e medições que abordam o enfrentamento da pobreza a partir
de uma perspectiva de etnia, enquanto na América Latina e no Caribe tal abordagem ainda é incipiente, sobretudo porque os instrumentos de coleta de informações (recenseamentos, pesquisas domiciliares e estatísticas vitais) geralmente não incluem as variáveis raça/etnia. A referida autora destaca que, tal
como nos Estados Unidos, Belize, Bolívia, Brasil, Chile, Equador, Guatemala,
Nicarágua, Peru, Paraguai e Trinidad e Tobago incluem a variável étnica ou
quesito cor, como no caso do Brasil, em alguns dos instrumentos de informa-
ções demográficas ou sobre padrões de vida (censos e/ou pesquisas em domicílios). Belize, Brasil, Cuba, Estados Unidos, Guiana, Peru, Trinidad e Tobago
e Uruguai incluem a variável raça/etnia/quesito cor nos atestados de óbito.
6
Guimarães e Novaes dizem, respondendo à pergunta “Quem são as pessoas
vulneráveis?: “São pessoas que por condições sociais, culturais, étnicas, políticas, econômicas, educacionais e de saúde têm as diferenças, estabelecidas entre
elas e a sociedade envolvente, transformadas em desigualdade. A desigualda-33
CAPÍTULO 2
A OPRESSÃO RACIAL/ÉTNICA, O DIREITO À DIFERENÇA E À
IGUALDADE E SEUS REFLEXOS NA ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE
Os argumentos ditos de cunho ideológico e os de escassez de dados,
ao fim e ao cabo, ainda que de modo indireto e talvez inconsciente, criam
barreiras que impedem que suas indicações de resolução dos problemas
ultrapassem os limites impostos pelo seu arsenal de análise: o “modelo
econômico”, ou visão economicista, das doenças, ainda que se agregue a
ele a idéia dos comportamentos insalubres (modelo ecológico). É uma
visão simplista e parcial da sanidade e da enfermidade reduzir o estar ou
não saudável às condições econômicas nas quais as pessoas vivem. Tratase, portanto, de uma explicação que só considera a produção social das
doenças e sua associação ao estilo de vida adotado pelas pessoas.
Inegavelmente o processo sanidade/enfermidade é multifatorial e
complexo, nele estão entrelaçados influências do meio ambiente físico,
social, político e cultural, todas em interação com as condições biológicas de cada ser humano. A condição biológica humana não pode ser
abstraída na analise do processo saúde/doença, pois sendo ela a
materialização da existência humana não podemos omiti-la. Desconhecemos o como e todos os porquês de as pessoas se manterem saudáveis
ou adoecerem. Os modelos contemporâneos (genético, econômico,
ambientalista, ecológico e modelo ou visão holística) que tentam explicar a
sanidade e a enfermidade, à exceção do modelo holístico, adotam visões
parciais, mas nenhum, isoladamente, consegue fornecer uma imagem
fidedigna da realidade.
Conforme Oliveira (1995)
“cresce a compreensão nos meios científicos de que as imagens
epidemiológicas necessitam incorporar a interpenetração das variáveis sexo/
gênero, raça/etnia e classe social para retratar a realidade com maior fidelidade. Esta tríade precisa ser analisada considerando a vivência do racismo
e as demais condições sociais e materiais nas quais a pessoa vive, além de
ressaltar que a condição biológica não é mais ou menos importante, apenas indispensável quando tratamos do ser humano. Estamos pois, diante
do desafio da necessidade de elaborar um novo paradigma capaz de explicar o que a ‘ciência normal’ do nosso tempo não tem conseguido”.
de, entre outras coisas, os torna incapazes ou, pelo menos, dificulta enormemente, a sua capacidade de livremente expressar a sua vontade”
6
. Para as autoras citadas, a autonomia é um atributo individual, enquanto a vulnerabilidade
pode ser individual ou coletiva (GUIMARÃES e NOVAES, s/d).34
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
Modelos explicativos do processo saúde/doença
“O modelo genético, muito em moda, tenta ser o único e verdadeiro
caminho que responderá e desvendará todos os mistérios da vida, ao
reduzir o destino das pessoas ao que portam os seus genes, pois deles
depende a forma como as proteínas das pessoas são produzidas.
O modelo econômico reduz o destino das pessoas às condições econômicas nas quais elas vivem, de maneira que essa explicação só considera a produção social das doenças.
O modelo ambientalista reduz o destino das pessoas às condições
do ambiente em que vivem. Isto é, o meio ambiente é o determinante
da saúde e da doença.
O modelo ecológico reduz o destino das pessoas ao estilo de vida que
elas adotam. Ou seja, a sua relação com o ambiente é o determinante
para a sanidade e a enfermidade.
O modelo ou visão holística baseia-se numa compreensão integral,
de interação entre a condição biológica do ser humano + meio ambiente físico, cultural e social. Apesar da abrangência e da visão de
integralidade, algumas correntes do holismo às vezes não compreendem que a desestabilização de uma destas variáveis pode ser suficiente
para desencadear ou determinar o processo de doença (por exemplo,
às vezes basta um problema em um gene, ou par de genes, para que
haja uma doença, caso da anemia falciforme). Ou seja, entendem que
o ‘todo’ – a visão de conjunto, a interdependência − sempre sobrepuja
as partes” (OLIVEIRA, 1997).35
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
Crueldade nas pesquisas biomédicas, historicamente, tem sido parte
de práticas racistas. Conforme Mota (1998):
“Uma das justificativas dadas pelos cientistas nazistas para a realiza-
ção de experimentos cruéis em judeus, ciganos, homossexuais e comunistas era que essas pessoas eram seres inferiores, que não tinham o estatuto de ser humano e, portanto, não estavam sob o manto das leis de
1900 e 1931 (WIGODSKI & HOPPE, 1996). Tanto que, ao ser perguntado de como uma nação civilizada como a Alemanha perpetrou
tantos horrores em experimentações em seres humanos, um médico no
Tribunal de Nuremberg respondeu: ‘You make not think it possible to
take it; but I assure you that men I thought decent men did take it. You
have only to decide that one group of human beings have lost human
rights’” (PULVERTAFT, 1952).
1996 −  Crianças cobaias na Nigéria:
11 mortas e 200 com deformidades
Denúncia veiculada pelo jornal Washington Post, em janeiro de 2001,
informa que pesquisa realizada em crianças nigerianas pela empresa norteamericana Pfizer, em 1996, testando o remédio Trovan Floxacin (para
combater um tipo de meningite cérebro-espinhal/CSM), resultou na morte
Capítulo 3
EVIDÊNCIAS DE  RACISMO NA
ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM  SAÚDE36
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
de 11 crianças e deformações em outras 200. Peter Edigbo, da
ChildRights África, declarou:
“A ação da Pfizer é detestável. Nossos governantes não devem permitir que os nigerianos sejam usados como cobaias para que uma empresa
ganhe dinheiro. Temos de recuperar os nossos direitos e, para isso, minha
organização trabalhará sem descanso”.
Apurar as denúncias parece impossível. Segundo Toye Olori:
“a obtenção dos arquivos médicos não será fácil, já que desapareceram as fichas médicas de 350 pacientes, tratados com CSM, entre abril e
junho de 1996”. [...] “o comissário de Saúde, Mansur Kabir, criou uma
equipe de três pessoas para investigar o assunto e disse que o seu ministé-
rio está assombrado com a denúncia. Kabir advertiu que todo aquele
que seja considerado responsável pelo comitê, cujas conclusões serão
divulgadas dentro de uma semana, enfrentará a justiça, seja qual for a sua
posição social” (OLORI, s/d).
Caso Tuskegee
De 1932 a 1972 o Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos da
América realizou uma pesquisa, cujo projeto nunca foi localizado, que
envolveu 600 homens negros, sendo 399 com sífilis e 201 sem a doen-
ça, da cidade de Tuskegee, no Estado do Alabama. O objetivo do estudo
Tuskegee era observar a evolução da doença, livre de tratamento. Não
foi dito aos participantes que eles tinham sífilis, nem os efeitos dessa
patologia. O diagnóstico dado era de “sangue ruim”. A contrapartida
pela participação no projeto era o acompanhamento médico, uma refei-
ção quente no dia dos exames e o pagamento das despesas do funeral.
A partir da década de 1950 havia terapêutica estabelecida para o
tratamento da sífilis, e mesmo assim os indivíduos incluídos no estudo
continuavam sem receber tratamento. Em 1969, a imprensa noticiou a
confirmação da ocorrência de 28 mortes no estudo. A repórter Jean
Heller, da Associated Press, publicou, no New York Times, em 26/07/72,
uma matéria denunciando o projeto. Após quarenta anos de acompanhamento, ao término do projeto, restaram apenas 74 sobreviventes,
sendo que mais de 100 pessoas morreram de sífilis ou de complicações
da doença. A instituição responsável pela condução do projeto, nas suas
últimas etapas, foi o Centro de Controle de Doenças (CDC) de Atlanta.37
CAPÍTULO 3
EVIDÊNCIAS DE RACISMO NA ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE
Em 1997 ainda 8 pessoas estavam vivas. O governo dos EUA decidiu
fazer um pedido de desculpas formais a todos os que foram enganados
durante o experimento de Tuskegee.
7
Segundo Mota (1998),
“Durante quatro décadas, 14 trabalhos científicos foram publicados
sobre este estudo. O que hoje conhecemos sobre os efeitos da sífilis no
coração, cérebro e articulações deve-se, em parte, a esse experimento. Peri-
ódicos científicos, tais como o New England Journal of Medicine e o American
Journal of Medicine, publicaram alguns destes artigos, que fazem referência
explícita aos dados obtidos nesse estudo. Nenhuma dessas revistas comentou as circunstâncias nas quais os dados foram obtidos”.
Estudo de Canto
Realizado por John Canto, da Universidade do Alabama (EUA), publicado em abril de 2000, revelou que negros têm menos chances de tratamento para ataque cardíaco. A pesquisa analisou prontuários de 234.769
pacientes do Medicare (seguro de saúde dos EUA que atende a cerca de 40
milhões de idosos e deficientes físicos) que sofreram ataques do coração.
Desse total, 26.575 eram candidatos óbvios a receberem medicamentos
ou cirurgia para o desbloqueio de veias do coração. Ficou comprovado
que, para cada 100 homens brancos dos EUA com ataque cardíaco que
têm suas veias desentupidas por medicamentos ou cirurgia, apenas 85
homens negros recebem o mesmo tratamento, e as mulheres negras, segundo o artigo, também recebem esse tipo de tratamento com menor
freqüência que as brancas. A conclusão é que “Negros, independentemente
de seu sexo, têm probabilidades significativamente menores que brancos de re-
7
 Texto da página do Núcleo Interinstitucional de Bioética  UFRGS – HCPA.
(www.ufrgs.br/HCPA/gppg/tuskegee.htm).
Mais dados sobre o assunto: Jones, JH.  Bad blood: the Tuskegee syphilis
experiment. New York: Free, 1993: 1-11; Vieira, S. e Hossne, W. S. Experimentação em seres humanos. São Paulo: Moderna, 1987:47.
Internet: Tuskegee – abril/1997 (New York Times); Tuskegee −  abril 1997
(Folha de São Paulo); The Troubling Legacy of the Tuskegee Syphilis Study http:/
/www.med.virginia.edu/hs-library/historical/apology/index.html;  O Caso
Tuskegee: quando a ciência se torna eticamente inadequada. Prof. José Roberto
Goldim, http://culturabrasil.art.br/RIB/boletim17.htm.38
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
ceber esse tratamento de grande eficácia no combate a ataques cardíacos”,
afirmou a equipe responsável pela pesquisa. Segundo Canto, “o estudo não
relacionou os dados com a condição socioeconômica dos pacientes, o que poderia
alterar as descobertas” (ESTUDO DE ..., s/d).
Diagnóstico errado de esquizofrenia em negros
Estudo realizado pelo Instituto de Psiquiatria da Grã-Bretanha, publicado em junho de 2000, indicou que os médicos interpretam algumas
reações dos negros erroneamente como esquizofrenia, já que eles não apresentam nenhuma doença mental. Negros que vieram do Caribe e vivem na
Grã-Bretanha têm seis vezes mais chances de diagnósticos de esquizofrenia
do que os brancos, mas uma pesquisa prova que não existe nenhum motivo biológico para isso. Segundo o diretor nacional do setor de saúde mental na Grã-Bretanha, Louis Appleby, “o sistema funciona, de fato, de forma
que alguns grupos raciais são prejudicados”. Outra conclusão da pesquisa é
que “a porcentagem de pessoas com esquizofrenia nos países de origem
dos negros caribenhos era a mesma que entre os brancos britânicos, derrubando assim a teoria de origem biológica da doença”(RACISMO..., s/d).
Pais negros e hispânicos têm
medo de racismo em hospitais
“Segundo uma pesquisadora norte-americana, os negros e hispânicos não procuram os hospitais nos Estados Unidos por medo de discriminação racial. Bebês negros e hispânicos, acima de seis meses de vida,
têm 70% menos chances de receber boa assistência médica – que inclui
visitas periódicas ao pediatra e a série de cinco etapas da vacinação – em
relação às brancas, informa o Medcenter.
Tal diferença está ligada mais às questões culturais, principalmente ao
medo e à vergonha da discriminação, do que propriamente às dificuldades de educação e salário. ‘Embora se tenha o objetivo de reduzir a mortalidade e morbidade (relação das pessoas doentes), ao se oferecer oficialmente um bom cuidado médico, é provável que muitas crianças norteamericanas estejam sofrendo de doenças preveníveis’, dizem as médicas
Donna Ronsaville e Rosemarie Hakim.
As pesquisadoras do Health Care Financing Administration, em
Baltimore, no Estado de Maryland, uma divisão do Health Human
Services, afirmam que a disparidade de qualidade de saúde entre negros e39
CAPÍTULO 3
EVIDÊNCIAS DE RACISMO NA ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE
brancos não diminui, mesmo quando os primeiros têm boas condições
socioeconômicas, como educação e renda” (PAIS NEGROS..., s/d).
Racismo de pesquisadores britânicos
contra crianças de Serra Leoa
“Já em 1994, meio século após Nuremberg, para procurar um método seguro e ético, nas palavras dos autores, de estudar a imunidade intestinal em crianças, foi realizada lavagem intestinal completa em 25 crian-
ças sadias com idade entre seis e nove anos, de Serra Leoa, África, introduzindo por via oral dois a três litros de solução hiperosmolar, até produzir
eliminação de secreção líquida pelo ânus, sem resíduos fecais. Apesar de,
na opinião dos pesquisadores, estas crianças terem sido submetidas apenas a um risco mínimo, uma dessas crianças desenvolveu distensão abdominal, febre, sudorese, cefaléia e taquicardia, além de ter vomitado cerca
de dois litros do fluido (HODGES et al., 1994), o que, evidentemente,
não caracteriza risco mínimo. Foi publicado no mesmo número desse
periódico científico um editorial defendendo a lisura ética desse trabalho, partindo da premissa que seus resultados poderiam, potencialmente, beneficiar todas as crianças (MILLA, 1994). O editorial não tocou
porém em outro ponto: seus resultados foram comparados com estudo
semelhante realizado em adultos ingleses voluntários. Porque então, não
realizar essa pesquisa não terapêutica em crianças inglesas, visto que quatro dos cinco pesquisadores envolvidos no estudo eram da Universidade
de Edimburg? Estes exemplos, que não são singulares, ilustram a dificuldade em se estabelecer padrões éticos nas pesquisas envolvendo seres
humanos, principalmente crianças” (MOTA, 1998).
Uso abusivo e desumano de
negros em pesquisas sobre malária
“No Quênia, trinta africanos adultos da tribo Luo, metade com e
metade sem o traço drepanocítico, foram inoculados com Plasmodium
falciparum, injetando-lhes 15 mililitros de sangue contaminado com
trofozoítos, com o objetivo de avaliar a proteção natural dos portadores
do traço drepanocítico à malária (ALLISON, 1954). Experimento semelhante foi realizado por Beutler et al. (1955) na Illinois State
Penitentiary, Joliet, EUA, com dezesseis prisioneiros negros norte-americanos que receberam injeções intravenosas de sangue infectado com
trofozoítos de Plasmodium falciparum” (MOTA, 1998).40
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
“Inventando uma epidemia –
Doenças tradicionais da África são chamadas de  AIDS
Estima-se que 70% de todos os casos de AIDS estão na África, o que
inspirou a secretária de Estado Madeleine Albright e o vice-presidente Al
Gore (no Conselho de Segurança das Nações Unidas) a declararem que
isto é uma ameaça para a segurança internacional – tão séria quanto
guerra. A AIDS é considerada agora a causa principal de morte na África,
com mais de dois milhões de mortes no ano passado, e a epidemia na
África sub-saariana está crescendo ‘quase sem controle’.
Mas Charles Geshekter, professor de história africana na Universidade do Estado da Califórnia, fez 15 viagens para a África e escreveu muito
sobre a AIDS naquele continente, e sua percepção da AIDS africana é que
ela é um prolongamento do ‘trem da alegria’ de especialistas da saúde
pública dos EUA. ‘A AIDS está encolhendo neste país’, ele me falou. Os
números estão caindo. O que sobra para os pedagogos de AIDS fazer? A
África acena.
A definição de Bangui
A AIDS é um nome para trinta doenças encontradas junto com um
teste positivo para anticorpos do vírus de imunodeficiência humana. Ser
positivo para o HIV, então, é a exigência que une as doenças para um caso
de AIDS.
Para diagnosticar AIDS na África, não é preciso nenhum teste de HIV,
apenas evidências clínicas estabelecidas por especialistas em saúde pública em uma conferência sobre AIDS em Bangui, uma cidade da República
Centro-Africana, em outubro de 1985, realizada pela World Health
Organization (WHO).
O que é um caso de AIDS na África, conforme o Consenso de Bangui?
Diagnostica-se AIDS pelos seguintes componentes: febres prolongadas (durante um mês ou mais), perda de peso de 10 por cento ou mais, e diarréia
prolongada. Os testes anti-HIV não precisam ser realizados! O Consenso
de Bangui foi publicado no Morbidity and Mortality Weekly Report do
CDC, e na revista Science (21 de novembro de 1986)
Charles Gilks, em 1991, escreveu no British Medical Journal que diarréia persistente com perda de peso pode ser associada com parasitas ordinários e bactérias, assim como também com infecções oportunistas, e
que em países onde a incidência de tuberculose é alta, como é nos da41
CAPÍTULO 3
EVIDÊNCIAS DE RACISMO NA ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE
África, números significativos de pessoas diagnosticadas como tendo AIDS
podem não ter AIDS. A definição de Bangui possibilitou a realização de
pesquisas com pequeno número de participantes cujos dados foram
projetados para nações inteiras.
Geshekter em recente visita à África do Sul afirma que constatou que
os testes de HIV são realizados em clínicas pré-natais e os resultados
extrapolados para o país. O problema é que a gravidez é só uma das
muitas condições que ativam um ‘falso resultado positivo’. A reação não
é específica ao HIV. Anticorpos para muitas outras infecções endêmicas
também ativam falsos alarmes de HIV. O problema é bem conhecido há
quinze anos e apenas isto já faz todas as projeções de AIDS africana sem
sentido.”(BETHEL, 2000).
Lactentes soronegativos para o
HIV no Zaire recebem vacina experimental anti-HIV
“A equipe chefiada pelo Dr. Zagury foi acusada de transgredir sistematicamente princípios éticos em pesquisas realizadas no Zaire, utilizando prisioneiros políticos como cobaias em um estudo (ALDHOUS, 1991). Em
uma outra pesquisa, realizada entre 1986 e 1987, um pequeno grupo de
voluntários zairenses, todos soronegativos para o HIV e imunologicamente
competentes, foi inoculado com uma vacina experimental contra o vírus da
síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS). Descobriu-se posteriormente
que esses ‘voluntários’ eram na verdade lactentes cujos pais haviam morrido
de AIDS e cujas mães estavam infectadas com o HIV. Apesar dessa pesquisa
ter sida aprovada pelos comitês de ética do Zaire, nos testes com a vacina
não foram observados procedimentos como consentimento após informa-
ção (MARWICK, 1991). Em estudos como esses, que pesquisadores de
países ricos realizam em locais pobres e de regimes políticos onde os direitos de cidadania não são respeitados, a aprovação apenas pelos comitês de
ética locais pode ser uma forma de burlar os princípios éticos que regulam
a pesquisa com seres humanos” (MOTA, 1998).
Estudo de Rakai (Uganda)
“No Estudo de Rakai, pesquisadores monitoraram 415 casais. Em
cada casal apenas uma pessoa estava infetadas com o vírus HIV. Os casais
foram orientados a adotar o sexo seguro e foram distribuídos preservativos. Foi cogitado que as pessoas com teste positivo para HIV deveriam42
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
informar ao(à) parceiro(a) ou pesquisadores deveriam fazê-lo. Mas, obedecendo à política de confidencialidade do governo de Uganda, os pesquisadores não informaram à pessoa não infectada de um casal que
seu(sua) parceiro(a) era portador(a) de HIV. Após 30 meses, 90 dos cônjuges saudáveis, aproximadamente 22%, se infectaram no período da
pesquisa! Os 415 ‘pares’ representavam uma amostra de um estudo de
15.217 residentes de Rakai. Os pesquisadores afirmam que nem eles sabiam as identidades dos pares durante a pesquisa.
Em um editorial do The New England Journal of Medicine, onde o
estudo foi publicado, a editora, Marcia Angell, acusou os pesquisadores
de usar o povo de Uganda como animais em um estudo que não teria
sido permitido nos Estados Unidos. ‘Durante 30 meses’, escreveu ela,
‘várias centenas de pessoas infectadas por HIV foram observadas mas não
foram tratadas’.
Alguns críticos, inclusive um grupo de Nova Iorque, denominado Cidadãos para o Cuidado Responsável & Pesquisa, foi mais adiante, comparando o Estudo de Rakai com o Caso Tuskegee. Os pesquisadores argumentam que o Estudo de Rakai foi aprovado segundo as normas científicas e de ética em pesquisa de Uganda e dos Estados Unidos. Depois que a
controvérsia começou, a UNAIDS, o escritório de Nações Unidas responsá-
vel pelas questões pertinentes à epidemia HIV/AIDS, afirmou que não encontrou nenhuma violação de normas éticas” (THIS STORY..., s/d).
Pesquisa sobre AIDS em Uganda cria polêmica ética
“Um estudo com mais de 15 mil pessoas na região rural de Uganda
originou questões éticas sobre a pesquisa da AIDS em comunidades pobres. A pesquisa causou polêmica, não por causa das conclusões, mas em
razão da forma como foi conduzida. Diferentemente de estudos sobre
HIV feitos em países desenvolvidos, desta vez não foi oferecido tratamento aos voluntários, nem os médicos informaram o parceiro saudável de
um paciente sobre a doença. Ao contrário, a equipe liderada por Thomas
Quinn, do National Institute of Allergy and Infectious Diseases, simplesmente testou os voluntários.
A pesquisa concluiu que o risco de disseminar AIDS via sexo heterossexual aumenta ou diminui conforme a quantidade de vírus circulando no
sangue. Publicado no Thursday’s New England Journal of Medicine, o
trabalho também confirmou pesquisas recentes sugerindo que a circuncisão protege contra a propagação do HIV, vírus causador da AIDS. A edi-43
CAPÍTULO 3
EVIDÊNCIAS DE RACISMO NA ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE
tora do New England Journal, Marcia Angell, disse que os especialistas
estavam divididos em relação à questão sobre se é ético negar tratamento
a pessoas de países pobres. Angel e outros especialistas temem que os
pesquisadores podem preferir fazer pesquisas sobre AIDS em países pobres, porque é mais barato e há menos obstáculos logísticos”.
8
As pesquisas sobre  AIDS nos países pobres
em geral exibem preconceito de classe e racial
“Outra questão emergente é a das pesquisas realizadas por pesquisadores dos países ricos (onde há restrições éticas mais rigorosas) em regiões
pobres do mundo, onde há menor rigor ético e legal para se pesquisar. Está
havendo um deslocamento das pesquisas para a periferia. Nos países desenvolvidos há uma exigência crescente de mais estudos das fases I e II e
estudos básicos de fase III, além de estudos de vigilância das fases IV e V e
de restrições a estudos com placebos (RUSSEL & GRACE, 1993). Isso
tende a deslocar as pesquisas clínicas para países onde a fiscalização é menos rigorosa (Marwick, 1988). Nesses locais os comitês de ética são mais
complacentes, os direitos chamados de terceira geração, os relacionados à
cidadania, menos respeitados e, conseqüentemente, maiores as facilidades
para pesquisar e custos, menores. Hubscher (1993), comentando a situa-
ção na Argentina, afirma que os laboratórios nem sempre escolhem pesquisadores adequados; a possibilidade de receitar seu medicamento é o
que, as vezes, determina a escolha. Raramente os aspectos éticos e
deontológicos são avaliados por um comitê independente, geralmente sendo
submetidos a comitês integrados por colegas dos pesquisadores que têm
qualificação e interesses análogos, e que já colaboraram também com laboratórios em trabalhos semelhantes. O consentimento após informação,
a aprovação final dos protocolos e seu seguimento e a verificação de dados
são, também, realizados precariamente.
Um exemplo disso são as pesquisas sobre AIDS realizadas em países
pobres. Os primeiros ensaios clínicos com vacinas contra o vírus da
imunodeficiência humana (HIV) revelaram outra faceta do desrespeito
ao outro e do seu não-reconhecimento como pessoa, a da falsificação.
Em um trabalho conjunto francês-americano do norte, os doutores
8
O Estado de S.Paulo, 30 de março de 2000. Reproduzido pelo Jornal da
Ciência (JCE-Mail), 30/março/2000 – No
 1510.44
PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS
Zagury e Gallo e seus colaboradores inocularam em 14 voluntários uma
vacina fabricada a partir de linfócitos B autólogos, transformados pelo
vírus Epstein-Barr infectados com vírus da vaccinia. Os resultados apresentados falavam do sucesso da resposta imunológica e não relatavam
complicações (PICARD et al., 1990). Provavelmente tudo ficaria como
estava, se um dermatologista francês, Jean-Claude Guillaume, não descobrisse que dois dos pacientes desse estudo desenvolveram infecção fatal pelo vírus da vaccinia (GUILLAUME et al., 1991). O dr. Robert
Gallo, dos EUA, envolvido em outros casos rumorosos de má conduta
ética, para se eximir de responsabilidades no caso, sintomaticamente utilizou argumentos semelhantes aos do cientista nazista dr. Hallervorden,
que colecionava cérebros de pessoas executadas. Alegou não se necessitar
de aprovação ética para estudar amostras de sangue, quando não se está
envolvido diretamente com a pesquisa, o que aliás parece refletir a opinião de muitos cientistas (MARWICK, 1991). Isto mostra o risco da
segmentação de procedimentos em pesquisa com seres humanos criar a
ilusão da falta de responsabilidade de cada um dos pesquisadores com o
ser humano utilizado como cobaia” (MOTA, 1998).
Negando remédio para a dor
Estudo do professor Jeffrey Mogil, Universidade de Illinois (publicado no British Medical Journal, 2000; 320:536), EUA, evidencia que a
percepção da dor é altamente individualizada, além de confirmar que há
diferenças qualitativas assim como quantitativas entre os sexos: as mulheres são mais sensíveis aos estímulos dolorosos, o que indica que só
expressa a realidade a comparação da sensibilidade dolorosa entre pessoas do mesmo sexo .
Pesquisa publicada pelo Annals of Emergency Medicine (2000; 35:11-
6, 77-81), de autoria de médicos da Emory University School of Medicine,
Atlanta, Georgia, EUA, avaliou retrospectivamente os prontuários médicos
de 217 pacientes portadores de fraturas de ossos longos atendidos em um
Departamento de Emergências Urbano durante mais de 40 meses. Do
total,127 pacientes eram negros e 90 eram brancos. Os pacientes possuí-
am lesões similares e queixas semelhantes de dor. No geral, 43 % dos
pacientes negros não receberam analgésicos, enquanto somente 26% dos
pacientes brancos não foram tratados para dor. Isto é, negros receberam
menos remédios para dor. Um estudo anterior conduzido pelo mesmo45
CAPÍTULO 3
EVIDÊNCIAS DE RACISMO NA ASSISTÊNCIA E NA PESQUISA EM SAÚDE
grupo na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, descobriu que
pacientes hispânicos também recebiam menos analgésicos para tratar a
dor ao serem atendidos nas salas de pronto-socorro.
O Dr. Knox Todd, que conduziu as pesquisas, afirma que:
“a. a diferenciação racial na prescrição de analgésicos não se deve às
diferenças na dor avaliadas pelos médicos como relatado pelos pacientes:
estereótipos raciais podem de maneira inconsciente e insidiosa atuarem neste momento, afetando o modo como os médicos atendem os pacientes;
b. alguns pacientes podem ser encarados como menos merecedores
de terem tratada a sua dor: tal é o caso, por exemplo, de criminosos
feridos durante combate com a polícia ou de pessoas envolvidas em brigas durante o uso de drogas ou álcool;
c.um outro ponto a ser investigado é se algumas pessoas agem de
modo que a dor pareça ser menos convincente do que outras, fazendo
que os médicos não dêem importância às queixas de dor; e
d. a sugestão dos pesquisadores é que sejam criados critérios padronizados para a avaliação da dor, eliminando critérios e condutas racistas.
Entre as alternativas sugeridas, estaria a criação de guidelines clínicos em
que se quantifique a dor em escalas, com recomendações específicas para
o uso de analgésicos em cada situação”.
A reprodução do racismo no setor saúde:
sobrevivência e cidadania em risco (2000)
 Pesquisa realizada pela cientista política Diva Moreira expõe as chagas produzidas pelo “processo de interação entre os mecanismos
discriminatórios e racistas, presentes na sociedade envolvente, e as desigualdades raciais constatadas no campo da saúde no Brasil”, pois abordou aspectos da dinâmica demográfica e o processo saúde/doença, assim como questionou os fundamentos doutrinários e científicos da
medicina ocidental.
Tendo como hipótese que “um dos fatores básicos que contribuem
para os diferenciais de saúde, observados entre negros e brancos, são as
práticas e as simbologias racistas institucionalmente presentes no campo da assistência médico-sanitária e nas relações médico-paciente”
(MOREIRA, 2000). Diva Moreira entrevistou na cidade de Belo Horizonte, MG, 120 pessoas, das quais 94 mulheres negras, 20 mulheres brancas e 15 médicos(as) de serviços públicos e privados, objetivando inves-46

PARTE I
ASSIMETRIAS ECONÔMICAS, EXCLUSÕES, VULNERABILIDADES, BIOCIÊNCIAS E PESQUISAS EM SERES HUMANOS

tigar as desigualdades e as discriminações raciais no “campo médico”.
Segundo a pesquisadora,
“embora não tenha se chegado a conclusões definitivas, a hipótese central de que a prática e a doutrina médica ocidental, ao responderem positivamente às injunções ideológicas de natureza racista, mostrou-se adequada para se entender o fenômeno das desigualdades raciais no campo da
saúde. Apesar de lacunares, as falas das mulheres negras sinalizaram que o
universo médico-hospitalar é constitutivo de uma lógica discriminatória e
fundada em concepções e mitos hegemônicos na sociedade brasileira, como
os da democracia racial e do racismo cordial” (MOREIRA, op. cit.).
Uma das conclusões da referida pesquisa não deixa margem para dúvidas quanto ao fato de o racismo ser uma realidade na assistência à saúde:
 “A análise das entrevistas apontou que o imaginário e as práticas racistas nem sempre são clara e racionalmente percebidas pelas pessoas,
embora deva-se reconhecer que é significativa a presença de relatos e
termos denunciadores do racismo no atendimento médico e hospitalar”
(MOREIRA, op. cit.).

fonte: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/0081.pdf

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